Reflexões Sobre o Salmo 1





O Salmo 1 é um Salmo de sabedoria, uma orientação prática sobre como Deus quer que vivamos. Nele há uma comparação, com o objetivo de contrastar o proceder do ímpio e o do justo. Vemos os benefícios de seguir ao Senhor e a ruína proveniente da desobediência.

O foco principal é a atitude em relação à lei do Senhor. Seguir ao Senhor neste Salmo é definido por satisfazer-se em seus mandamentos, em sua palavra.


Bem-aventurado o homem que não anda segundo o conselho dos ímpios, nem se detém no caminho dos pecadores, nem se assenta na roda dos escarnecedores.

Bem-aventurado costuma ser entendido ou até traduzido como feliz, mas “feliz” restringe, ou diminui o conceito de bem-aventurado que pode ser melhor definido como aquele que encontra a aprovação de Deus, aquele que alcança sua assistência, seu auxílio, seu favor, sua graça especial. Logo, podemos entender que aquele que não é bem-aventurado está desassistido por Deus, abandonado à própria sorte, desaprovado.

O bem-aventurado é definido aqui pelo seu não proceder, por atitudes que ele não pratica, em relação a um tipo de pessoa que nos é apresentada por meio de três adjetivos.

Três verbos nos são apresentados: 

  • andar, 
  • deter-se e 
  • assentar-se. 

Vemos uma decrescente na ordem dos verbos, primeiro, caminha junto, seja por vontade própria ou apenas por se deixar levar, sem opor resistência, depois passa a permanecer junto e até a imitar a conduta daquele com quem antes ele apenas caminhava e, por fim, ele encontra um apoio estável ao ponto de sentar-se, não apenas imitando as condutas, mas, agora, confiando que é o melhor a fazer. Age da mesma forma; aquele proceder criou raízes em sua mente e coração.

Passemos agora a analisar os adjetivos:

  • forma, 
  • pecador e 
  • escarnecedor 

Em uma análise no dicionário podemos encontrar significados assustadores e as três palavras podem ser vistas como sinônimas e qualificar aquele que não conhece ao Senhor. Os significados comumente encontrados são: não ter ou desprezar qualquer tipo de fé, herege, ateu, desobediente, desumano, cruel, irônico, aquele que zomba, que menospreza e, até, digno de pena.

Além disso, temos também que analisar as expressões de ligação entre as ações e os adjetivo:

  • segundo o conselho, 
  • no caminho e 
  • na roda. 

Salvo melhor análise, podemos entender que o salmista se refere à convivência. Não apenas uma convivência apática, meramente formal, que em nada agrega à vida dos conviventes, mas um convívio íntimo, ao ponto de buscar opiniões para a caminhada e para a tomada de decisões importantes, um convívio que traz aprendizado, que agrega valores. Entretanto, aqui no salmo, essa transferência se dá daquele que não segue ao Senhor para aquele que segue e, infelizmente, não ao contrário. A influência é do ímpio sobre o justo.

Antes o seu prazer está na lei do Senhor e na sua lei medita de dia e de noite.

Imediatamente, fazendo um contraponto, “antes” nos diz “pelo contrário”, ou “em vez disso”. Se o salmo começou nos dizendo como não proceder em relação a quem, agora ele nos diz como proceder e em relação ao que.

O “o que” é a lei do Senhor, seus mandamentos, sua palavra; personificando, é o próprio Deus, uma vez que Ele se manifesta e nos instrui por meio das Escrituras. A lei pode ser um mandamento específico, como “não matarás”, por exemplo, ou toda a Bíblia.

A conduta esperada, o “como proceder”, é apresentada também por duas ações, ter prazer e meditar. Ter prazer significa satisfazer-se, contentar-se, alegrar-se e essa primeira atitude nos leva à segunda: meditar, que é pensar sobre algo, ponderar, estudar, amadurecer longa e fortemente uma ideia.

E essas atitudes são contínuas, de dia e de noite, sempre, constantemente, em tudo, por causa de tudo e para tudo. É um ciclo, quanto mais nos contentamos com a Palavra de Deus, no cenário por ela revelado (criação, queda, redenção e consumação), mais queremos aprender e compreender nosso papel na história, mais conhecemos o amor de Deus, o seu querer, e mais nos contentamos em sua vontade, reconhecendo sua soberania. Mais e mais a nossa adoração se torna verdadeira e nos conscientizamos de nossa total dependência, reconhecendo o Senhor como fonte de todo o suprimento.

Ele será como árvore plantada junto a correntes de água, que no devido tempo dá o seu fruto, e cuja folhagem não murcha; e tudo quanto ele faz será bem-sucedido.

Vemos, então, a maravilhosa consequência: o bem-aventurado é bem-sucedido em tudo quanto ele faz, porque o que ele faz, certamente provém do Senhor. Por meio da meditação na Palavra, o Senhor lhe dirige os passos, lhe conduz. Na verdade, uma vez que conhece os planos de Deus, ele busca viver esses planos e não mais suas vontades egoístas.

Há também mais uma linda comparação desse homem com uma árvore. Isso acontece outras vezes nas Escrituras, uma árvore saudável e devidamente enraizada, que é útil, por trazer frescor, sombra e frutos. Uma vez que se alimenta do Senhor, devidamente enraizado do Deus e em sua palavra, ele frutifica.

O bem-aventurado não apenas encontra favor e graça do Senhor para si, mas também é instrumento nas mãos de Deus, conformando-se à imagem de Cristo, para auxiliar e fornecer conforto e sustento aos outros. Que felicidade imensa podemos encontrar nesta vida terrena, ser usado por Deus!!

Os ímpios não são assim; são, porém, como a palha que o vento dispersa.

Novamente a contraposição: enquanto o povo de Deus é comparado a uma árvore, o ímpio é comparado à palha, não tem raízes, não se sustenta, foi uma planta, mas agora está morta e seca, nada pode fazer de bom, a não ser sujeira, e um sopro de vento a dispersa.

Por isso, os perversos não prevalecerão no juízo, nem os pecadores na congregação dos justos. Pois o Senhor conhece o caminho dos justos, mas o caminho dos ímpios perecerá.

E, então, a grande sentença; enquanto os justos encontram aprovação do Senhor, os perversos serão condenados diante do Grande e Poderoso Juiz. Toda desobediência, zombaria e crueldade será finalmente exposta no tribunal do Senhor, não havendo mais oportunidade. Finalmente, na congregação dos justos, no novo céu e nova terra, não haverá lugar para práticas pecaminosas.

Há dois caminhos, o do justo e o do ímpio, e eles são aqui diferenciados pelo relacionamento com a Palavra de Deus. O caminho do justo é conhecido pelo Senhor, porque é por Ele mesmo traçado, o homem bem-aventurado tem comunhão íntima com o Senhor. Entretanto, o caminho do ímpio o distanciará cada vez mais do Senhor e o levará a um único lugar, a perdição.

Podemos extrair deste belíssimo Salmo ao menos três importantes lições;

– Por vezes, temos tido comunhão com a impiedade por meio de relacionamentos pessoais, mídias sociais e até programas de TV. Podem ser as conversas estranhas que tomamos parte na escola, os assuntos da hora de almoço com colegas de trabalho, as páginas ou pessoas que seguimos nas mídias sociais, as filosofias mundanas que entram em nossa mente por meio de novelas, músicas e comerciais, por exemplo. Thomas Watson, mencionou em um sermão proferido em 1662: “Tem cuidado com as más companhias. Evita qualquer familiaridade desnecessária com os pecadores. Ninguém pode apanhar saúde de outrem; mas pode-se apanhar doenças. A doença do pecado é altamente transmissível.”

– Precisamos nos alegrar com a Palavra de Deus. Que tesouro precioso temos ao nosso alcance. Temos que meditar na lei do Senhor, incessantemente, depender totalmente dessa comunhão com o Senhor. A oração e a leitura da Palavra devem ser nossa prioridade diária. Não temos sido sal e luz do mundo, mas temos nos contaminado com o pecado, muitas vezes até sem perceber, porque nos falta conhecimento, profundidade, não examinamos todas as coisas à luz das Escrituras como precisamos fazer e, por isso, tropeçamos e nos deixamos influenciar.

– Por vezes podemos ler esse Salmo e nos maravilhar com a expressão “e tudo quanto ele faz será bem-sucedido”, no final do verso 3. Acreditamos que se frequentarmos a igreja, lermos a Bíblia e fizermos, religiosamente as nossas orações, o Senhor atenderá nossa vontade, seremos prósperos nessa terra, não sofreremos enfermidades.

Realmente, o Senhor pode nos abençoar assim, mas prefiro entender prosperidade ou ser bem-sucedido com uma conformidade à vontade boa, perfeita e agradável do Senhor. Quanto mais conhecemos e nos sujeitamos em obediência à Palavra de Deus, mais cresceremos em santidade e em comunhão verdadeira com o Senhor, sendo instrumentos em Sua mão.

Que Deus nos conceda graça e misericórdia e que possamos cada vez mais compreender sua palavra e aplica-la às nossas vidas.


Maira C. M. Izzo de Carvalho