A cognoscibilidade de Deus




Comecemos com a realidade que Deus é Incompreensível, porém, Cognoscível (que pode ser conhecido.) Em outras palavras, não vamos conseguir reduzir Deus um conceito de compreensão pois nossa mente é limitada, porém, Deus se faz conhecer de acordo com o que Ele deseja se revelar ao homem.

Esse é o cerne da questão quando tratamos o assunto sob a perspectiva da teologia reformada: Deus pode ser conhecido, mas é claro que ao homem é impossível ter um conhecimento perfeito e exaustivo de Deus. Por razões óbvias, o homem não consegue, em sua limitação, trazer uma definição clara de Deus no sentido estrito da palavra, portanto, só é possível descrever Deus de forma parcial. Se usarmos a razão lógica para definir Deus enfrentamos a certeza de tentar reduzi-lo ao limite de nossa capacidade intelectual.

Porém, o conhecimento de Deus só pode ser adquirido a partir da Auto-revelação de Deus, e cabe ao homem enfrentar o desafio de compreender isso mediante a fé. Esse tipo de conhecimento é o que coloca em evidência o relacionamento entre Deus e o homens, sendo que neste fica claro ao homem da absoluta soberania, majestade e grandeza de Deus e a insignificância do homem diante de Deus. 




A Negação da Cognoscibilidade de Deus 


Há muito tempo, a possibilidade de conhecer a Deus tem sido negada em diversas perspectivas. As maiores contestações são apoiadas nas limitações da faculdade cognitiva humana, na qual a afirmação atesta que a mente humana é incapaz de conhecer qualquer coisa além do que é natural, e, portanto, necessariamente superficial cega o homem nas questões transcendentais e espirituais. Aqui, vemos o exemplo do típico pensamento agnóstico, que por vezes não negam a existência de Deus, mas que duvidam se Ele existe ou não. 


A argumentação agnóstica foi influenciada e até mesmo estabelecida por nomes como Hume, Kant, Sir Willian Hamilton, Herbert Spencer entre outros. Vamos observar a seguir quais são os pontos comumente usados para sustentar a negação da Cognoscibilidade de Deus: 



(1) O homem só tem conhecimento mediante analogia. Esta afirmação argumenta que só podemos conhecer algo que tem algum tipo de analogia com a nossa experiência e natureza. Concordo que é um fato de que aprendemos muitas coisas por analogia, porém, aprendemos muitas outras coisas por contraste. Inclusive, no contraste, são justamente as diferenças que nos apontam um campo de conhecimento. Ponto este que os escolásticos utilizavam em seu pensamento, pois eliminavam de Deus as imperfeições das criaturas. Aos cristãos, algo que nunca podemos esquecer, é que somos imagem de Deus, portanto, há analogias entre a natureza divina e a natureza humana. 

(2) O homem realmente conhece somente aquilo que ele pode captar em sua totalidade. É a tese que argumenta que o homem, que é finito, não pode compreender Deus que é infinito, e por não dominar o infinito, logo, não pode conhecer a Deus. O grande problema dessa afirmação é o fato de invalidar um conhecimento parcial. Obviamente, conhecimento parcial é um conhecimento real. Se tratarmos todo conhecimento parcial como inválido, todos os campos do conhecimento deveriam ser invalidados, o que não faz o menor sentido. 


(3) Todos os predicados de Deus são negativos e, portanto, não fornecem conhecimento real. A lógica de Hamilton consiste em dizer que o infinito e absoluto só podem ser compreendidos com um nível muito alto de negação, e, portanto, não podemos receber nenhum tipo de concepção. Para os cristãos, esse tipo de afirmação não é um dilema, até porque, amor, espiritualidade, santidade, benevolência e diversos outros atributos de Deus são predicados positivos. Ainda que não conseguimos conhecer Deus em sua totalidade, o que em partes corrobora com os predicados negativas, ainda assim, as ideias sobre Deus são positivas. 


(4) Todo o nosso conhecimento é relativo ao sujeito que exerce o conhecimento. É a tese que argumento que fazemos uma leitura do conhecimento a partir de nossos sentidos e capacidades, e não como o conhecimento de verdade é. O problema desta afirmação é que anula a realidade objetivo que é o conhecimento real. Levemos também em conta que as leis de percepção não são arbitrárias e correspondem diretamente à natureza das coisas e do campo de estudo, e sem essa correspondência, qualquer tipo de conhecimento verdadeiro seria impossível. 





Auto-Revelação - Requisito de todo Conhecimento de Deus 


Uma vez que entendemos e superamos as argumentações que tentam negar a cognoscibilidade de Deus, a seguir vamos examinar e compreender as formas que Deus nos concede para O conhecer.


· Deus transmite conhecimento de si próprio ao homem. A teologia é diferente em sua forma de busca do conhecimento pois em outras áreas da ciência, como investigador, o homem se posiciona acima do objeto de sua pesquisa e de forma ativa, utiliza o método que lhe for mais conveniente para extrair o conhecimento. No caso da teologia, não há possibilidade do homem se posicionar acima de Deus, pois o homem só pode conhecer a Deus na medida que Deus, de forma ativa, Deus se faz conhecido. E mesmo após Deus revelar-se de forma objetiva, o homem só compreende algo se Deus lhe abrir os olhos, ou seja, não é a razão humana que faz o homem conhecer Deus. 


· Conhecimento de Deus, inato e adquirido. Conhecimento inato é aquele que tem origem na própria constituição da mente humana sendo este imagem e semelhança de Deus. Este não é o tipo de conhecimento que se adquire através do esforço humano, mas sim, que está no homem. Já o conhecimento adquirido é o resultado o estudo de Deus após a revelação ativa de Deus. Este não tem uma origem espontânea pois somente através de muito esforço e dedicação, sob a orientação o Espírito Santo, é que tal conhecimento é estruturado. 


· A revelação geral e a especial. Na Bíblia, podemos encontrar em diversos versículos que há uma revelação de Des na natureza, na ordem do mundo e na mente do ser humano, sendo estes exemplos da revelação geral. Versículos como Salmo 19:1, Atos 14:17 e Romanos 1:19-20. Sobre a revelação especial, podemos encontrar exemplos claríssimos em passagens como 2 Reis 17:13, Salmo 103:7, João 1:18. Hebreus 1:1-2, etc. 


Ainda sobre a revelação natural e especial, as maiores discussões sobre o tema têm origem na distinção da forma que ambas são comunicadas ao homem, e também as evidências presentes no decorrer da história. Na teologia reformada, a distinção entre ambas consistia em apontar que a revelação natural está encarnada nas coisas, e revelação sobrenatural, está na Palavra de Deus. 

Notamos também que a revelação geral está enraizada na criação e que a mesma é dirigida de forma particular à razão humana, e que consiste na descoberta do propósito da vida do homem, que é conhecer a Deus e ter comunhão com Deus. Já a revelação especial está enraizada no eterno plano de redenção do Senhor, e que está direcionado ao homem que é pecador, e que somente mediante a fé pode ser compreendida. A revelação especial também mostra que apesar da escravidão do pecado, o homem foi criado para ter comunhão com Deus. 




Conclusão 


Este artigo não esgota o tema até mesmo pelo fato da ampla discussão filosófica do mesmo ao longo da história, porém, conseguimos compreender como Deus se revela ao homem, quais são argumentações frágeis que dizem que Deus não pode ser conhecido e como, biblicamente, conseguimos comprovar a revelação natural e especial de Deus. 

O fato de entendermos como podemos conhecer a Deus é de extrema relevância, justamente por discernimos que o Senhor nos abriu os olhos para buscarmos mais conhecimento dEle. A misericórdia de Deus foi manifesta em nossa vida quando compreendemos que através de nossos esforços humanos, nós nunca iríamos encontra-LO, pois é Ele que nos encontra, nos chama, nos abre os olhos, nos dá a fé, e a capacidade de estudarmos sua Santa Palavra, sob a orientação do Espírito Santo. 



Deus os abençoe. Em Cristo. 



Rev. Marco Cicco